Guia clínico sobre pericardiopatias: causas infecciosas, autoimunes e neoplásicas, diagnóstico laboratorial e por imagem, pericardite aguda, derrame pericárdico, tamponamento cardíaco e pericardite constritiva.
O que são Pericardiopatias?
As pericardiopatias englobam todas as doenças que acometem o pericárdio, podendo ser primárias ou secundárias.
- Representam cerca de 5% dos atendimentos de dor torácica no pronto-atendimento.
- Entre os pacientes com supra de ST, 1% pode ter causa pericárdica e não coronariana.
Causas de Pericardiopatias
- Infecciosas:
- Virais: enterovírus, ecovírus, EBV, herpes simples, influenza, CMV.
- Bacterianas: pneumococo, meningococo, hemophilus, chlamydia, mycoplasma, leptospira.
- Tuberculose: importante causa em imunossuprimidos.
- Autoimunes: LES, artrite reumatoide, esclerodermia, dermatomiosite, polimiosite, febre reumática, PAN, síndrome pós-cardiotomia.
- Neoplasias: invasão tumoral direta ou disseminação hematogênica (pulmão, mama, linfoma).
- Pós-IAM:
- Epistenocárdica: precoce (2–3 dias).
- Síndrome de Dressler: tardia (3 semanas–6 meses).
- Renais: pericardite urêmica ou associada à diálise.
- Outras: trauma, pós-radiação, hipotireoidismo, HIV.
Exames Laboratoriais
- Troponina: pode estar elevada em miopericardite.
- PCR e VHS: aumentados em até 75% dos casos, úteis para diagnóstico e seguimento.
- BNP: auxilia na diferenciação entre pericardite constritiva e cardiomiopatia restritiva.
Exames de Imagem
- ECG:
- Supra difuso de ST (< 5 mm, concavidade para cima).
- Relação ST/T > 0,25 em V6 sugere pericardite aguda.
- Evolução distinta do IAM: inversão da T ocorre após normalização do ST.
- Raio-X:
- Cardiomegalia quando derrame > 200 ml.
- Silhueta globular e, em casos crônicos, calcificação (25%).
- Ecocardiograma:
- Exame fundamental para diagnóstico e prognóstico.
- Detecta derrame, espessamento pericárdico, sinais de tamponamento e constrição.
- Espessura > 3 mm → alta acurácia para constrição.
- TC e RM: úteis em casos de calcificação, neoplasia, derrames loculados ou dúvida diagnóstica.
- Medicina nuclear: pode auxiliar no diagnóstico diferencial de pericardite infecciosa ou associada a doenças sistêmicas.
Pericardite Aguda
- Quadro clínico: dor torácica pleurítica, piora em decúbito, melhora na posição de prece; febre e atrito pericárdico (85%).
- Exame padrão-ouro: RM cardíaca.
- Tratamento:
- AINEs (ibuprofeno 600 mg 8/8h, AAS em DAC).
- Colchicina → reduz recorrências (COPE trial).
- Corticoide apenas em situações especiais (TB, autoimune, uremia, gestação, falha terapêutica).
- Fatores de risco para complicação: pulso paradoxal, Kussmaul, derrame volumoso, trauma, imunossupressão, recorrência.
Derrame Pericárdico
- Abordagem depende do volume e repercussão hemodinâmica.
- Derrames volumosos (> 20 mm): geralmente requerem drenagem (pericardiocentese ou cirurgia) pelo risco de tamponamento.
- Avaliação laboratorial do líquido: celularidade, glicose, marcadores tumorais, culturas, PCR, ADA.
- Etiologias comuns: TB, neoplasias, DRC, autoimunes.
Tamponamento Cardíaco
- Fisiopatologia: acúmulo de líquido no saco pericárdico → compressão de câmaras → queda do enchimento diastólico e do débito cardíaco.
- Clínica: dispneia, hipotensão, estase jugular, abafamento de bulhas (tríade de Beck), pulso paradoxal.
- Exames:
- ECO: colapso de AD (mais sensível) e VD (mais específico), dilatação de VCI, variação respiratória dos fluxos mitral/tricúspide.
- ECG: baixa voltagem, alternância elétrica.
- Tratamento: drenagem imediata (pericardiocentese guiada por ECO).
Pericardite Constritiva
- Ocorre pela rigidez e inelasticidade do pericárdio, limitando o enchimento diastólico.
- Clínica: anasarca, ascite, refluxo hepatogugular, pulso de Kussmaul, knock pericárdico.
- Exames:
- Raio-X: calcificações em 30%.
- ECO: alterações de enchimento.
- RM cardíaca com realce tardio = padrão-ouro.
- Tratamento: pericardiectomia em casos refratários.
Conclusão
As pericardiopatias incluem um amplo espectro de doenças que vão desde quadros agudos autolimitados até emergências graves como o tamponamento.
O diagnóstico exige integração clínica, laboratorial e de imagem.
O tratamento deve ser individualizado, com foco em AINEs e colchicina nas formas agudas, drenagem em derrames volumosos, pericardiocentese urgente no tamponamento e pericardiectomia nos casos constritivos.