Guia clínico atualizado sobre febre reumática: fisiopatologia, manifestações clínicas, critérios de Jones, cardite, artrite, coréia, nódulos subcutâneos, eritema marginado, tratamento e profilaxia.
O que é Febre Reumática?
A febre reumática (FR) é uma doença inflamatória sistêmica que ocorre após infecção de orofaringe por Streptococcus beta-hemolítico do grupo A.
- Ocorre em indivíduos geneticamente predispostos, por mimetismo molecular entre a proteína M do estreptococo e o tecido cardíaco.
- É mais comum entre 5 e 15 anos, rara abaixo de 3 anos e acima de 15.
- O período de latência entre a faringoamigdalite estreptocócica e a FR é de 1 a 4 semanas.
A FR é a principal causa de valvopatia no Brasil, especialmente estenose mitral.
Lembre-se: a febre reumática “lambe a articulação e morde o coração”.
Manifestações Clínicas
- Cardite (pancardite):
- Principal e mais grave manifestação.
- Acomete preferencialmente a valva mitral, depois mitroaórtica e aórtica isolada.
- Fase aguda → geralmente insuficiência valvar.
- Pode ser subclínica (detectada apenas pelo ECO).
- Complicações: IC, arritmias, morte súbita.
- Artrite:
- Ocorre em até 75% dos primeiros surtos.
- Migratória, assimétrica, autolimitada, acometendo grandes articulações.
- Tratamento: AAS (80–100 mg/kg/dia), naproxeno, indometacina.
- Coréia de Sydenham:
- Manifesta-se meses após a infecção (1–6 meses).
- Mais comum em meninas.
- Sintomas: movimentos involuntários, labilidade emocional, fraqueza muscular.
- Tratamento: benzodiazepínicos ou fenobarbital em casos leves/moderados.
- Nódulos subcutâneos:
- Firmes, móveis, indolores, localizados em superfícies extensoras.
- Associados a cardite, desaparecem em até 1 mês.
- Eritema marginado:
- Lesões fugazes, com bordas avermelhadas e centro claro.
- Raro, geralmente associado a cardite.
Diagnóstico
O diagnóstico é baseado nos Critérios de Jones, apoiado em evidências de infecção estreptocócica prévia (ASLO positivo, cultura ou teste rápido).
Critérios de Jones (2015 – AHA)
- Maiores: cardite, artrite, coréia, eritema marginado, nódulos subcutâneos.
- Menores: febre, artralgia, aumento de VHS/PCR, prolongamento de PR no ECG.
- Diagnóstico: 2 critérios maiores ou 1 maior + 2 menores + evidência de infecção estreptocócica.
Importante: todo paciente com FR deve realizar ecocardiograma, mesmo sem sopro, para detectar cardite subclínica.
Tratamento
Cardite
- Leve: não precisa corticoide.
- Moderada a grave: corticoide sistêmico (prednisona 1–2 mg/kg/dia, máx. 80 mg/dia).
- Casos refratários: pulsoterapia com metilprednisolona.
- Controle de IC: diuréticos, restrição de sal, vasodilatadores em IAo.
- Cirurgia em casos graves refratários.
Artrite
- AAS em altas doses é primeira escolha.
- Alternativas: naproxeno, indometacina.
- Não usar corticoide isoladamente (exceto se houver cardite associada).
Coréia
- Tratamento sintomático: benzodiazepínicos, fenobarbital.
- Local calmo, repouso e acompanhamento clínico.
Profilaxia
- Primária: diagnóstico e tratamento precoce de faringoamigdalite estreptocócica.
- Benzetacil 1.200.000 UI, dose única IM.
- Secundária: prevenção de recorrências em quem já teve FR.
- Benzetacil a cada 21 dias (ou 15 dias em casos graves).
- Duração: até 21 anos ou 10 anos após último surto; em cardite crônica, pode ser vitalícia.
Conclusão
A febre reumática é uma doença ainda prevalente no Brasil e responsável pela maioria das valvopatias.
O diagnóstico é clínico, baseado nos critérios de Jones, sempre com suporte de ecocardiograma.
O tratamento deve focar no controle da inflamação, prevenção da IC e profilaxia secundária rigorosa para evitar recorrências.
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